quinta-feira, 11 de março de 2010

PARTIDA

Era uma noite singular, não existia beleza, tudo era obscuro. Todos já imaginavam a tua partida, todos de algum jeito buscava consolo de algum jeito, uns contavam causos, outros rezavam pedindo ao senhor para que não levasse ele, o que o deixasse ali, que recuperasse tuas forças e voltasse a ser o que sempre foi, um eterno sonhador. Ele agonizava naquele leito, naquele hospital, naquela avenida movimentada da metrópole cinza, carros passavam apressados, rumos diversos, alegria e tristeza se misturava naquele caos. Avistava os arranha-céus da janela do corredor, não tinha coragem de ficar ali dentro, dentro daquele leito obscuro de morte, esperando o suspiro derradeiro. Não pedia para ele ficar, nem partir, pedia para ele voltar a ter paz, seja lá aonde fosse, ele teria que ter a paz que aqui neste lugar que todos chamam de terra não teve. Imaginava o sofrimento das pessoas -  naquela cidade. E na alegria também. Pois a vida sempre há de ser o que é, sofrimento para uns, tristeza para outros, pois a felicidade nunca há de ser plena, pois sempre existirá o medo de perdê-la. As horas passavam devagar, o médico já tinha avisado para a família que ele não resistiria muito, pois a vida dele estava nas mãos dele, que não se podia fazer mais nada. Que o câncer havia se espalhado pelo o corpo. Bastava apenas a espera, pois não deve existir espera tão dolorida, quanto a espera daquele que esta prestes a morrer. Cenas do passado se passava pela minha cabeça, lágrimas escorriam pelo o meu rosto, tentava me pegar no passado, na alegria que ele sempre manteve dentro daquele lar, da pessoa singular e simples que sempre foi. Os conselhos que me dava - que dizia sempre para ser uma pessoa boa, não fazer mal à ninguém, pois essa terra sempre foi regada com ódio e sofrimento, que bastava apenas plantar amor, para num futuro se colher rosas. Pensava nas tardes que passávamos juntos em frente a televisão vendo jogos de futebol, e sua paixão doentia pelo o clube alvi-negro. Me perdia em pensamentos, porque uma pessoa que sempre plantou o bem, que sempre fez a coisa certa, tinha que sofrer tanto na sua despedida desta terra. Rogava praga a Deus, por levar ele assim, por não levar ele numa outra noite qualquer, quando sua alegria era irradiante. Se não podia morrer na cama ao lado da mulher que sempre amor, encostado na tua face ( pois sempre uma face de uma mulher será o consolo para o sofrimento dos homens), porque não podia morrer ali, ou até mesmo num dos bares que tanto passou. Tudo se perdia naquela noite, me perdia de mim, tentava pensar no que seria sem a companhia dele ao meu lado. Não sabia se resistiria viver sem a companhia tão agradável dele. Pensava nas pessoas que ali estavam na mesma situação que a minha, esperando a pessoa que mais amou na vida esperando o relógio badalar para o suspiro de adeus. A cidade me invadia, invadia meu ser, ali que ele tanto viveu, desde o momento que abandonou tua Gerais, que veio atrás de uma vida melhor. Que aquelas avenidas não sentiria mais os passos lentos dele. Que os bares que ele tanto freqüentou sentiria o banco vazio aonde ele costumava sempre sentar. Fiquei ali a devagar sobre a vida, sem entender nada dela, sem entender porque sempre tem que ser assim. A madrugada se aproximava, as horas de vida dele diminua, a minha também. A coragem que me faltava para entrar naquele quarto, me veio. Respirei fundo, enxuguei as lágrimas que escorriam   pelo o meu rosto, pois tenho a certeza que ele não gostaria de ver chorando. Abri a porta, avistei o corpo dele magro coberto pelos lençóis, avistei a paz que ali existia, avistei a solidão noturna naquele leito de morte. Tua respiração era lenta, me aproximei da cama, peguei tuas mãos dei um beijo, segurei firme, chorei como nunca antes havia chorado, lamentei tudo aquilo, lamentei que dentro de algumas horas, ou talvez alguns dias ele não estaria mais ali. Beijei tua face, assim como ele fazia comigo nas noites em que passei no hospital com pneumonia ( na qual quase morri). Me lembrei que hoje era o inverso, que agora era eu que beijava tua face assim como um pai faz com um filho. Fiquei poucos minutos ali, pude perceber que ele não resistiria aquela madrugada, algo me dizia que não, que morreria no amanhecer do dia, assim quando o sol desperta a cada manha, ele despertaria para tua eterna partida deste mundo. Dei novamente um beijo na tua face, sussurrei no teu ouvido, que sempre haveria de estar com ele e ele sempre haveria de estar comigo aonde quer que fosse. Caminhei lentamente, abri a porta, antes de fecha-la lancei um olhar de adeus e de agradecimento por tudo na direção dele, pude perceber que mesmo dormindo sentiu minha presença ali, fechei a porta. Senti o peito doer, contive as lágrimas, prometi nunca mais entrar num leito à espera da morte levar aqueles que amo, de lá pra cá, os dias não foram mais os mesmo, de lá pra cá, as manhas nunca foram tão silenciosas e doloridas para mim, pois o vazio que ele deixou naquela casa, ainda sinto, por longos anos sentirei, até o meu partir daqui.  

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