terça-feira, 9 de março de 2010

Sentado na porta

Perdido nos caminhos e labirintos da vida, a cada dia tentando se achar, se perdendo aos poucos, coração partido, vagando pelos bares e ruas solitárias de minha infância aonde o buteco e o papo é o refúgio imediato para a dor. Ou seja a minha sina é essa, é sofrer, é amar, é lamentar. Como a noite - aonde se aparece os vazios da alma, aonde é difícil esquecer o preto da solidão, como disse é no bar e no papo que busco alento. Hoje depois de uma noite memorável, depois de um longo papo que durou cerca de 6 horas, depois de algumas ampolas geladas, e a saudade doendo aqui dentro, com os olhos marejados deixo aqui uma cena que não sairá da cabeça por o resto de minha vida ( que temo achar que não durará muitos anos). 

Sentado na porta

Sentado na porta do buteco para que todos que ali passassem pudesse ver, que ali vivia mais um bêbado de porta. Aqueles que ficam numa das mãos o cigarro, na outra o copo. Companhia inseparável. A noite linda, lua prateada no céu, algumas poucas estrelas, acalmava o peito meu. Dolorido e cansado de outrora. Relembrando amores que se perderam no escuro num quarto vazio - meu velho amigo, querido, me fazia companhia. Pois nessas horas o amigo, o bar, as garrafas, são as melhores companhias. Alguns carros passavam acelerados na ânsia de chegar ao destino, buteco vazio, alguns freqüentadores, poucos, mas fiéis ao estabelecimento. Quando observo uma mulher, no auge dos seus 50 anos, observando o marido ( assim achei), enxugando uma ampola de Brahma, para ser mais preciso acho que já era a décima. A mulher ficou ali do meu lado, reparei no olhar dela, olhar vazio, olhar triste, perdido naquele ambiente. Falei para o meu amigo, que aquela mulher estava esperando alguém sair de la de dentro. Ele ainda comentou a beleza da mesma. Concordei dizendo que era uma mulher bonita apesar da tristeza que vinha dela. O meu amigo ainda zoando da minha cara, me chamando de poeta, disse que era linda, que amaria ela para o resto da vida. Algo me chamava, algo de curioso vinha daquela mulher, algo que não sei explicar. Ela arremessou a guimba do seu cigarro na guia da calçada, entrou no buteco, pegou nos braços daquele homem, que zanzava, lamentando, querendo terminar a saideira. Ela disse calmamente, vamos embora, vamos embora, pediu a conta, pagou. Todos imaginavam que a mulher faria uma escandalosa, mas não, uma paz saiu daquela mulher, ela venho caminhando em direção a porta, abraçado com teu marido que chamava carinhosamente de nego, dizendo que terminaria a saideira em casa - que tinha cerveja na geladeira, que ela o amava. Sairam os dois de braços dados, ela guiando o marido bêbado pelas ruas de minha infância. Ficamos ali, eu e meu amigo, se perguntando a respeito de tal, ele que é casado, me disse:
- Malandro, essa é a mulher que sempre sonhei para mim...

Sem precisar dizer mais nada, pois a noite veio no brilho daquela cena, a luz da vida vi no olhar daquela mulher, que além dos pesares, além de tudo, o amor  fala e grita dentro dela. 

Depois disso, daquela cena, que ficou e certamente ficará dentro de mim, por longos anos, foram mais algumas ampolas geladissímas que enxugamos com uma sede de ontem, tendo a certeza mais uma vez, que o buteco é o melhor lugar para se ficar.

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